Moraes vs. Musk: polarização e poder no campo de batalha digital
Clara Becker
O comportamento virtual de Elon Musk, recentemente envolvido no Brasil e em disputas públicas com Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), reflete tendências globais de polarização política e a natureza tóxica do discurso público. Assim como nos EUA, Musk usa no Brasil suas redes sociais como plataforma para expressar opiniões fortes e muitas vezes desdenhosas sobre seus críticos, incluindo Moraes. Esse comportamento espelha a dinâmica divisiva e amplificadora de conflitos vista em muitas figuras políticas, tanto no Brasil quanto no mundo.
A presença de Musk no Brasil, incluindo suas reuniões com o ex-presidente Jair Bolsonaro e declarações públicas subsequentes, colocou-o no centro das tensões políticas brasileiras. Sua crítica vocal a certas instituições democráticas, especialmente após os ataques de 8 de Janeiro — quando os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário foram atacados — destaca ainda mais o papel que figuras públicas como Musk podem desempenhar, seja amplificando ou atenuando conflitos.
Essa dinâmica no Brasil, no entanto, não se limita a Musk. A política brasileira há muito é moldada por figuras polarizadoras que usam linguagem extrema para mobilizar seus apoiadores. O próprio Moraes, embora seja uma figura central na defesa das instituições democráticas, também foi criticado por sua abordagem no combate à desinformação, que alguns argumentam restringir a liberdade de expressão. Essa tensão entre a necessidade de defender os valores democráticos e o medo de um possível abuso de poder é uma questão central no momento político atual do Brasil. O desafio central neste contexto é observar como figuras públicas lidam com discordâncias e conflitos, além de buscar formas de remediar conflitos alimentados por discursos polarizantes. A abordagem de Musk, caracterizada por ataques pessoais e desprezo público, alimenta a animosidade e aprofunda as divisões.
Isso não se trata de suas crenças em si, mas de seu método de engajamento. Da mesma forma, figuras polarizadoras da esquerda brasileira, como políticos ou intelectuais públicos, também podem contribuir para o ciclo de toxicidade ao espelharem as mesmas táticas combativas que criticam em seus oponentes.
Imagine uma versão de Musk que, embora ainda mantenha suas crenças, engaja-se com figuras como Moraes ou críticos da esquerda política de uma forma que reconheça sua humanidade e motivações, mesmo que discorde delas. Essa mudança de comportamento não só reduziria a animosidade, mas também criaria espaço para um debate democrático mais saudável — algo urgentemente necessário no frágil ambiente democrático do país.
Em ciclos eleitorais, o Brasil enfrenta uma especial encruzilhada crítica. Figuras públicas, influenciadores e líderes políticos têm uma escolha sobre como se engajar com seus oponentes. Continuar a amplificar conflitos e demonizar o “outro lado” só empurrará o Brasil ainda mais para um futuro polarizado e instável, assim como nos EUA. Se quisermos reduzir a natureza tóxica da política brasileira, precisamos de mais figuras mais moderadas, que estejam dispostas a desafiar comportamentos prejudiciais dentro de seu próprio grupo político.
À medida que o Brasil lida com questões de polarização política, figuras como Musk servem como um lembrete de que a forma como nos engajamos no discurso público pode tanto curar quanto dividir ainda mais as sociedades. Ao nos perguntarmos se nossos métodos estão criando mais toxicidade ou promovendo um diálogo mais saudável, podemos começar a construir um futuro mais estável e democrático para o Brasil.
Uma dica para construir espaços de diálogo e ajudar a frear a polarização danosa é evitar uso de linguagem desumanizante, como chamar o outro de “anta”, “burro”, “câncer” e afins. Esse tipo de linguagem é perigosa, retira a humanidade da outra pessoa e pode levar a graves crimes de ódio.
É preciso, ainda, frear a construção de um constante ambiente de ameaça, em que “nós versus eles” tem cedido lugar a “nós ou eles”. Considere também enfatizar a necessidade da interdependência de todos os grupos e que nosso futuro, nossa segurança e a democracia só serão de fato protegidos se tivermos uma sociedade plural, com pensamentos distintos, e com a capacidade de diálogo restabelecida.
Coluna publicada no portal Metrópoles
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